A parte mais difícil, certamente, é aceitar o afeto que sinto. Aceitar que o amo e fim. Embora por muitas ensaiei em te dizer, por fim, acabei dizendo metades. Tentei demonstrar em algumas sutilezas, mas, mesmo assim, nem palavras, gestos, abraços ou presença poderiam exprimir a tormenta que se formava em meu peito. Minha certeza é que gosto. Gosto e fim. Depois de quase te afastar de mim, por causa de minhas inseguranças, creio que esteja mais lúcida. Preciso de desapego, meu bem. Precisamos. Preciso permanecer assim, sozinha sem estar solitária. Embora tortuoso, posso continuar curtindo da maneira possível a minha vida, sem angústias ou dramas. Traçando os planos e tentando fazer coisas, por mim, que ninguém mais poderia fazer. Estou tentando crescer. É difícil, porém creio hoje estar mais forte do que ontem. Quero deixar o comodismo e a preguiça para lá. As múltiplas queixas e planos infrutíferos. Quero deixar a mulher forte que eu sei que existe dentro do meu íntimo florescer e criar raízes fortes. Tenho aprendido algumas coisas e desejo aprender cada vez mais. Pois sou pequena, pequenina, um ser em infinito aprendizado. E, ah, só receio lhe contar algo: essas coisas não estão nos livros ou revistas ou filmes ou jornais. Tais preciosidades são adquiridas pelo viver. Por constantes monólogos interiores e mudanças de rotina. Pertencem ao mundo sensível e ao mundo das ideias, concomitantemente. São deliciosamente subjetivas. Enfim, desapego, meu bem. Desapego e aceitação. Aceitar que nenhum tempo, por mais extenso que fosse, não seria suficiente para que pudéssemos realizar todos os nossos desejos. E, dessa forma, podemos aproveitar de forma mais doce os momentos que nos são concedidos. Aceitar os meus defeitos e brigar com eles, diariamente. Aceitar o peso acima da média, o corpo fora dos padrões impostos, aceitar que tenho limitações e não deixar que elas me limitem. Aceitar a família que tenho, problemática, desunida, estressada, que ainda é família. Aceitar e aprender que a vida é feita de pequeninos momentos e que não vale a pena perder tais momentos chateada com pequenas coisas que pouco significam e que, na maioria das vezes, fogem do seu controle. E, quanto ao desapego. Bem, tenho observado que amor também é desapego. Também é incondicional. Meu afeto independe de teus gestos. Claro que o quero, o desejo teu abraço, tua presença, teus sorrisos e tuas palavras. Por outro lado não preciso necessitar disso para sobreviver. Posso, muito bem, continuar gostando da mesma forma, mesmo sem a presença física. Já disse que, de alma, permanece aqui comigo. E sempre permanecerá. Pois, verdadeiramente, penso em engolir as saudades, as desatenções, os ciúmes, as idealizações outrora sonhadas. Ciúmes e exclusividade não caem bem, são demasiado pesados, só trazem tristeza.
Assim, meu bem, vá. E venha quando quiser. Não me importa quantas bocas beijou em minha ausência ou por quantas mulheres se enamorou. Não me importa se você ligou para todos menos para mim ou se provavelmente esquecerá o meu aniversário. Sei que é difícil. Especialmente é muito difícil tocá-lo. Sei o quanto quis tocá-lo e embalá-lo em meus braços. Quis tatuar o toque delicado de tuas mãos que apertaram a minhas, no escuro, em um silêncio absoluto. Quis gravar o teu olhar quente, intenso, que vive a me comunicar sem nada dizer. Quis engarrafar o teu cheiro, para que eu o sentisse, às vezes, quando a saudade desatinasse. E, quis, principalmente, sentir o calor do teu corpo próximo ao meu, que tanto quis estar mais próximo, mas que recuou quando te sentia cada vez mais próximo. E quando me vi irresistivelmente vulnerável, com as minhas defesas se reduzindo a pó. Temi perdê-lo, temi perder toda a doçura deste gostar, temi que fugisse, que não compreendesse, temi aceitar que realmente estava apaixonada e não havia nada que eu pudesse fazer a respeito. Por isso nada disse e por isso, hoje, sinto o meu peito sereno. Eu te amo por tudo e por nada. Eu te amo, sem reticências ou “mas”. Gosto e continuarei a gostar, independentemente dos caminhos que iremos tomar. Pois não há nada que eu possa fazer a respeito.